No "Notícias" de 1 de Setembro de 2007, o Dr. Joaquim Madeira, ex-Procurador - Geral da República de Moçambique, teve a coragem de reconhecer que existem interferências do poder político na actividade do Ministério Público. Extraí somente a parte que me interessa, ei-la:
"...NOT - E no nosso caso, há ou não interferência?
JM - Estaria a mentir se dissesse que não acontece.
NOT – Desta forma, o dever profissional fica prejudicado?
JM - Infelizmente. Por dever profissional, você tem que dizer ou fazer algumas coisas, mas por algumas conveniências ou não diz ou tem que dizer de outra maneira. É uma vida um tanto ou quanto complicada. Qualquer procurador vai encontrar dificuldades de trabalhar. O meu amigo do Panamá estava a investigar um caso de 11 milhões de USD, que envolvia um antigo presidente e a vida política daquele país, passou mal. No Malawi foi a mesma coisa. Veja que nem havia sido ele a prender e processar um antigo presidente. Isso chocou o poder político, foi convidado a abandonar o cargo."
JM - Estaria a mentir se dissesse que não acontece.
NOT – Desta forma, o dever profissional fica prejudicado?
JM - Infelizmente. Por dever profissional, você tem que dizer ou fazer algumas coisas, mas por algumas conveniências ou não diz ou tem que dizer de outra maneira. É uma vida um tanto ou quanto complicada. Qualquer procurador vai encontrar dificuldades de trabalhar. O meu amigo do Panamá estava a investigar um caso de 11 milhões de USD, que envolvia um antigo presidente e a vida política daquele país, passou mal. No Malawi foi a mesma coisa. Veja que nem havia sido ele a prender e processar um antigo presidente. Isso chocou o poder político, foi convidado a abandonar o cargo."
Na verdade, há que reflectirmos profundamente em torno do que o ex-procurador disse. O Dr. Madeira convida-nos, desta forma, a um grande debate sobre o actual estado de coisas no sector da justiça, particularmente no sector por ele dirigido durante 7 anos.
14 comentários:
Ilídio.
Acho interessante que tenhas tocado neste assunto. Na verdade, a mim intriga-me esta postura do EX-PGR na sua saída. ACHO muito estranha a sua atitude. Isto não retira a validade do que propões como tarefa importante, nomeadamente a de reflectir sobre a relação entre os poderes. Devemos pensar talvez nas condições de possibilidade da independência desses poderes no nosso sistema político. O ex-procurador pouco vez a esse respeito, pelo contrário. O estranho é que o procurador fala, mas não diz nada! E o seu nada não fala. E fala agora que saiu, supostamente, porque já não está comprometido ou numa posição de risco. Pois eu penso que é como procurador que ele deveria se sentir mais protegido para dizer o que está dizer agora (nada) que é Zé-ninguém. Muito estranho. A sua acção só compromete, a partida o trabalho do seu sucessor porque vem reforçar o ambiente conspiratório que ele criou e esta a deixar. E pior do que isso, surge como a homem honesto vítima de um sistema corrompido. Convenhamos! Ele que demonstrou não saber o que estava a fazer naquele pelouro, está sacudir o capote para se sair como herói. E já há sociólogos a corroborarem a sua honestidade inata. Daqueles que acham que precisamos e que só com homens honestos é que podemos desenvolver o país. Para mim o ex-procurador perdeu uma boa oportunidade de ficar calado.
Excelente, caro Patrício! De facto é preocupante a atitude do Dr. Madeira. Deixe-me só citar uma parte do seu conmentário:"Devemos pensar talvez nas condições de possibilidade da independência desses poderes no nosso sistema político. O ex-procurador pouco fez a esse respeito, pelo contrário. O estranho é que o procurador fala, mas não diz nada! E o seu nada não fala. E fala agora que saiu, supostamente, porque já não está comprometido ou numa posição de risco". Ora bem, por que razão só agora o ex-PGR se pronunciou naqueles termos? Penso que todos nós temos as respostas! O novo PGR durante o seu mandato, certamente que não vai falar das interferências do poder político. Mas logo que cessar as suas funções, possivelmente falará do que Madeira fala hoje; ceratmente falará das dificuldades intencionalmente colocadas naquela casa. Temos é que discutir as razões de tudo isto. Repare que a actuação de todos PGR´S demonstrou profundas e anedóticas fragilidades do nosso Estado.Em Moçambique, o Procurador-Geral é nomeado só para o mundo saber que também temos um Procurador; que nestas coisas de Estado de Direito não estamos atrasados, apenas isso. O mundo pensa que temos um órgão a desempenhar o seu real papel. Falso! Às vezes e tal como diz Dostoiévski, no seu romance "O IDIOTA", no meio de flores podemos encontrar uma víbora. Dentro da Procuradoria há víboras.E como diz alguém: "Pensem nisso".
sob ponto de vista jornalístico, o entrevistador não cumpriu cabalmente com o seu papel de informar ao público. Vejam só um exemplo: "...NOT - E no nosso caso, há ou não interferência?
JM - Estaria a mentir se dissesse que não acontece.
NOT – Desta forma, o dever profissional fica prejudicado?
Alguém pode me dizer se há continuidade? Explico-me: O antigo procurador admitiu que existe interferência política. A admissão, em si, é um grande "furo" que o jornalista deveria ter explorado. Por exemplo, era possível perguntar que tipo de interferência existe; quem interfere exactamente; quais foram os casos onde houve interferência; como é que a procuradoria se comportou face a essa interferência; que estratégias institucionais foram encontradas para pôr cobro às interferências; entre outras questões.
Bayano.
Ainda bem que despertaste do “sono dos justos”.
O teu comentário é interessante, pelas perguntas que mostras terem sido omissas. Já havia notado essa falta de rigor nas questões dos jornalistas na entrevista que o comandante geral da polícia deu ao Notícia. No caso do PGR, he, he, he, esse procurador de cada vez que resolve falar só dá razão aos que notaram que não estava preparado para o cargo que lhe incumbiram.
O Patrício diz que "o Procurador fala mas não diz nada" o Bayano fala de perguntas que ficaram por fazer. Com muita verdade.
Me parece que a preocupação do Jornal ou do Jornalista era dar voz ao ex-procurador para que dissesse algo (fosse o que fosse)... sempre desperta o interesse do leitor. Enquanto que para o ex-procurador, que parece ainda um tanto ou quanto atrapalhado com a situação, parece que a preocupação era dizer algo que o desculpasse do que (não) fez durante 7 anos a frente da PGR e lançar alguma pressão para o novo em jeito de aviso como quem diz: "A SUA COMPETÊNCIA NÂO SERÀ SUFICIENTE POIS AI HÁ MUITA INTERFERÊNCIA DO PODE POLÍTICO"...
O que fica por dizer é mesmo o que o Bayano questiona Quem exactamente interfere? de que jeito? Com que fim? Como cidadão (e pelo cargo ocupado) e como procurador qual é o dever perante tal interferência?
MAs como nos casos de corrupção neste caso da interferência não haverão rostos ou, se aparecerem, serão tão patéticos por desprovidos do poder que se tenta fazer crer que têm.
Caro Mutisse, caro bayano, caro patrício,o debate está bom. Muito fino e bastante didáctico. Estamos de parabéns.Ó, Caro Mutisse, permita-me fazer uma pequena citação: "O que fica por dizer é mesmo o que o Bayano questiona Quem exactamente interfere? de que jeito? Com que fim? Como cidadão (e pelo cargo ocupado) e como procurador qual é o dever perante tal interferência?" Quanto a mim, estas perguntas trazem consigo as respostas. Repare: Questão 1:Quem exactamente interfere? E eu digo: quem não sabe levante o braço!! Questão 2:De que jeito ocorre tal interferência? E eu digo: quem é que não sabe levante o braço!! Questão 3: Com que fim? E eu digo: Quem não sabe levante igualmente o braço!! Meus caros patrícios, para um bom entendedor, meia palavra basta.
meu braço está levantado, espero que estejas a ver.
Boa, caro elísio. Sei que levantou ironicamente. Brincadeira!!
ilídio, meu caro, não estou a brincar. gostaria mesmo de saber se, neste assunto, o ex-pgr pensa como eu também. dizer esse tipo de coisas faz bem à esfera pública. o braço já me doi...
Na verdade, o jornalista pode ter presumido que os leitores soubessem as respostas. Presumiu demasiadamente e de forma inaceitável.
Meu caro Ilídio,
Não só o jornalista PRESUME que se saiba. Ao responder "quem não sabe levante o braço!!" presumes também que muitos sabem. Ao sugerir que o ESM levanta o braço ironicamente demonstras não acreditar que ele não saiba. E pode não saber mesmo.
Alias, acredito que o própio Ilídio devesse levantar o braço. É que esta "INTERFERÊNCIA DO PODER POLÍTICO NA ACTIVIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO" é tão vasto que nele cabe qualquer coisa e qualquer pessoa.
É mais uma daquelas situações que falamos e repitimos mas nada transpira para fora.
O poder político é exercido por um conjunto de pessoas devidamente identificadas e aglomeradas em determinadas organizações. É sabido que pelo Direito Penal comum não está consagrada responsabilidade Penal para as pessoas colectivas. Antes, só as pessoas singulares são susceptíveis de responsabilização criminal.
Nestes termos, o tal PODER POLÍTICO que pressiona, tem que ter um "ponta de lança" que age no sentido de coarctar a acção dos magistrados do ministério público maxime do PGR. O PGR, apercebendo-se disto DEVE AGIR EM CONFORMIDADE promovendo a punição desses individuos.
Agindo assim, as questões que eu coloquei estariam respondidas. Não numa entrevista na imprensa. Mas na acção diaria do PGR.
Saberiamos quem de entre os detentores do poder político intefere na actividade do Ministério Público (individualizando), Como o faz, para que fins etc etc etc.
Assim continuaremos a gritar para o alto sem um destinatário concreto.
Pode ser fácil dizer: é gente da Frelimo ou da Renamo. Mas quem exactamente. Todos na Frelimo interferem na actividade do Ministério Público? Acreito bem que não.
Vamos problematizar mais esta questão talvez cheguemos lá.
Acho vago/vazio demais afirmar "INTERFERÊNCIA DO PODER POLÍTICO NA ACTIVIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO"... apesar do passo que é a sua confirmação.
Caro Mutisse, mui obrigado pelo comentário que fazes. Bom, levantas uma série de questões importantes e que de certeza enriquecem este debate.é verdade que há coisas que dizes das quais distancio-me por completo. Por exemplo aquela de "direito penal...pessoas colectivas...responsabilidade penal" é muito problemática. Por outro lado, dizes que: "Ao responder "quem não sabe levante o braço!! presumes também que muitos sabem."! Ora bem, aqui PRESUMES também. Ou não? Outra frase tua é esta:"Alias, acredito que o própio Ilídio devesse levantar o braço." Quem? Eu mesmo? Não levanto o braço, caro mutisse, acredite! O teu está levantado? Outra frase tua que achei interessante: " O PGR, apercebendo-se disto DEVE AGIR EM CONFORMIDADE promovendo a punição desses individuos" Bom, nesta frase nada posso fazer senão colocar reticências. Quanto a última frase do teu comentário,aceito que o título pode ser vazio e vago. O debate de ideias não consiste apenas em dizer que isto ou aquilo está errado, mas também em dizer como é que a coisa devia estar. Assim o debate fica mais fino e didáctico. Penso.Por isso, questiono:qual é a tua sugestão, meu caro?
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