Ainda em torno das explosões do paiol de Malhazine, lí no "Notícias" de 4 de Abril de 2007, uma informação que merece algum reparo. Ei-la: " Na sequência das explosões do paiol de Malhazine, o Governo decidiu " criar um gabinete para a gestão da reconstrução e reabilitação dos bens danificados, para a cobertura dos danos causados aos cidadãos e garantir a participação activa dos cidadãos afectados na gestão deste processo", indica o Secretariado do Conselho de Ministros, em comunicado enviado ontem aos órgãos de comunicação social. Reunido na sua 7ª sessão ordinária, indica o documento, o Executivo decidiu ainda prestar, no contexto da assistência médica e medicamentosa, próteses e pensões" ( os itálicos são meus).
Se realmente for este o conteúdo central do documento emitido pelo Conselho de Ministros, então estamos muito mal.
Vejamos porquê!
1. Extrai-se da informação acima citada, que o governo está concentrado na reparação dos danos patrimoniais os quais, correspondem à frustração de utilidades susceptíveis de avaliação pecuniária, como na hipótese de perda de bens.
2. Parece que o governo não quer( talvez por enquanto) se pronunciar em relação a uma série de danos não patrimonias ou morais resultantes da explosão do paiol. Falo sobretudo do dano morte. ( Isto me preocupa). Mas antes cumpre trazer o conceito de dano não patrimonial, para que estejamos no mesmo barco.
3. Danos não patrimoniais ou morais correspondem `a frustração de utilidades não susceptíveis de avaliação pecuniária, como o desgosto resultante da perda de um ente querido.
4. A indemnização por morte de um ente querido, não elimina o dano sofrido, pelo menos permite atribuir ao lesado determinadas utilidades que lhe permitirão alguma compensação da Lesão sofrida sendo, em qualquer caso, melhor essa compensação do que coisa nenhuma.
5. Na verdade, a perda da vida constitui para o titular, o dano máximo que ele poderia suportar e representaria uma autêntica contradição valorativa que a lesão de outros bens pessoais ( como saúde, a liberdade ou a honra) legitimasse, em caso de morte da vítima, os herdeiros a reclamar indemnização pelos danos sofridos e a perda da vida já não o permitisse. A perda da vida constitui assim claramente um dano autónomo, cujo direito à indemnização se transmite aos herdeiros da vítima, assim ensina o Prof. Luís Manuel Teles de Menezes Leitão.
6. O artigo 496, nº 2 do Código Civil refere-se, de forma clara, aos danos não patrimoniais sofridos por outras pessoas, em consequência da morte da vítima.
7. Efectivamente, a morte de uma pessoa, constitui um facto que é susceptível de provocar dor e sofrimento numa série de outras pessoas, desde os familiares, amigos e até simples conhecidos ou admiradores. Naturalmente que não seria aceitável a multiplicação de pretensões indemnizatórias em consequência da mesma lesão, pelo que o legislador veio restringir o círculo de pessoas que pode pedir indemnização pelos danos resultantes da morte de um ente querido.
8. Portanto, é claro que os familiares das pessoas que falecerem em consequência das explosões do paiol de Malhazine têm direito à indemnização.
9. Por isso, causa alguma estranheza que o comunicado do Conselho de Ministros, cujo conteúdo nos foi dado a conhecer pelo "Notícias" de 4.04.07, não se refira à indemnização do dano-morte.
10. O Governo deve se referir à indemnização do dano-morte. Se tal não ocorrer, os moçambicanos não se sintirão satisfeitos.
É o meu apelo!!
2 comentários:
caro ilídio, tenho andado longe da internet, mas ontem e hoje tive algum tempo para consultar. fico contente por constatar que continua a trazer a público este tipo de reflexões. isto é muito importante. para além das questões de âmbito jurídico há, neste caso do paiol, um problema mais fundamental de concepção da intervenção política. há um grande equívoco colectivo que contradiz tudo quanto se faz mesmo ao nível da macro-economia. a nossa ideia de responsabilidade é muito problemática e, por isso, é dífícil descortinar qualquer tipo de coerência no que é feito. prometo debruçar-me sobre este assunto nas próximas semanas. abraços.
Caro Dr. Elísio Macamo,muito grato pelo comentário. Estou com "sede" das suas intervenções na blogosfera. A ideia que se tem sobre responsabilidade, no nosso País, é deveras preocupante. Espero que cumpra, como tem feito, a promessa de se debruçar sobre este assunto.
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