quarta-feira, julho 23, 2008

Enxada de cabo curto indispensável para "revolução verde"?

O Ministro da Agricultura, o sr. Soares Nhaca, afirmou, em Milange, Província da Zambézia ( ao que parece, no âmbito da visita presidencial àquele ponto do país), em entrevista concedida à Rádio Moçambique, que a enxada de cabo curto era também um elemento imprescindível no contexto da "Revolução Verde". Confesso que após ter ouvido o pronunciamento do Ministro da Agricultura( logo pela manhã de hoje) fiquei muito preocupado. Enxada de cabo curto imprescindível no contexto da Revolução Verde? Afinal o que é revolução verde e qual é a sua finalidade? Será que temos que continuar a contar com enxada de cabo curto nesta dura batalha que é a revolução verde?O que é revolução verde afinal?
Se revolução verde é um amplo programa idealizado para aumentar a produção agrícola no mundo por meio de melhorias genéticas em sementes, uso intensivo de insumos industriais, mecanização e redução do custo de manejo, não vejo então a razão de termos que continuar a falar de enxada de cabo curto. Estamos num mundo em que toda a gente fala de mecanização da agricultura. Este é que é o discurso corrente, todavia, em Moçambique há quem confie ainda na enxada de cabo curto. Com este tipo de pronunciamento, fico sem saber o rumo que estamos a tomar...Reconheço, na verdade, que a enxada de cabo curto, num país como o nosso, desempenha um papel importante para a produção familiar. Mas ela não pode ser tida como um dos instrumentos fundamentais no contexto dum desafio muito grande como o é a revolução verde. A enxada não nos permite produzir em larga escala ao ponto de competirmos no mercado regional e mundial. Embarquemos para a revolução verde com determinação e coragem e, sobretudo, convencidos que somos capazes de abandonar a enxada confiada pelo Ministro da Agricultura. Não reproduzamos discursos de há 30 anos atrás!!

quinta-feira, julho 10, 2008

Cartão de Identificação tributária, propriedade do Governo ou do Estado?

Tenho estado a fazer uma análise sobre alguns aspectos que tem manchado a nossa Administração Pública. É que aqui as coisas não vão tão bem como alguns procuram dar a entender. Já me debrucei acerca do balcão de atendimento único que de único parece nada ter. Já me debrucei acerca dos montantes que são cobrados pelos cartórios notarias no acto de reconhecimento de assinatura constante duma procuração forense. E hoje trago uma questão que parece simples mas tem um grande significado no plano jurídico. É a seguinte: O Ministério da Finanças, através da Direcção Nacional de Impostos e Auditoria, tem emitido um cartão ao qual atribui o nome de "Cartão de Identificação Tributária". Este cartão ostenta o número único de identificação fiscal do contribuinte. No mesmo cartão pode-se ler o seguinte e cito: " Este cartão é pessoal e intransmissível, e é propriedade do Governo de Moçambique"( o destaque é meu). Ora, a questão que coloco é se o Governo é proprietário de alguma coisa na República de Moçambique. Na verdade, o Governo para ser tido como proprietário de seja o que for é necessário que seja um sujeito de direitos, ou seja, é necessário que tenha personalidade jurídica( que é a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações). Tanto quanto julgo saber, o Governo da República de Moçambique não tem personalidade jurídica, logo não pode ser titular de um direito de propriedade, neste caso concreto do "cartão de identificação tributária." Portanto, o referido cartão não é, aliás, nem pode ser propriedade do Governo. O aludido cartão é, isso sim, propriedade do Estado moçambicano, pessoa colectiva do Direito Público e, como é óbvio, ente distinto do Governo. Só para elucidar: caso eu "venda" o aludido cartão e, o Governo se sinta lesado e desta forma decida propor uma acção em tribunal pela violação de um suposto direito de propriedade, tal acção só pode ser liminarmente indeferida pelo Tribunal por falta de personalidade judiciária do Governo, nos termos do que dispõe a alínea b) do n.º 1 do artigo 474.º do Código de Processo Civil. Ou seja, o pedido do Governo pode ser indeferido por este não poder ser parte no processo. O mesmo se pode dizer naqueles casos em que é danificada uma viatura "pertencente" a um Ministério. Nestes casos, a acção de indemnização não pode ser intentada pelo Ministério pois este não é sujeito de direitos, não tem personalidade jurídica. Aconselho o Ministério das Finanças a corrigir o lapso. Ao invés de : " Este cartão...é propriedade do Governo de Moçambique", deve ser: Este cartão... é propriedade do Estado Moçambicano", por que este, o Estado, é que é sujeito de direitos, é que tem personalidade jurídica.

quinta-feira, julho 03, 2008

Quando a investigação criminal falha( um olhar ao caso Albano Silva)

O Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, proferiu, em 1 de Julho de 2008, a sentença relativa ao caso Albano Silva. Fez-se aquilo que eu esperava. Os réus foram todos absolvidos, por falta de provas concludentes. Este é um caso que deve servir de licção aos responsáveis pela instrução de processos crime. Falo do Ministério Público, incluindo os agentes da Polícia de Investigação Criminal. A Pic omitiu neste caso (voluntária ou involuntarariamente) diligências imprescindíveis no âmbito da instrução do processo. Não houve exame balístico, só para elucidar! Até porque, o próprio ofendido, o Advogado Albano Silva, instado a comentar depois de proferida a sentença, afirmou que reconhecia a imperfeição da instrução feita no âmbito do seu processo. Aquando do julgamento dos agentes da PRM supostamente envolvidos na fuga de Anibalzinho da cadeia de máxima segurança, o juiz Caetano absolveu-os porque não havia provas concludentes. Em ambos casos concluo que a PIC, pecou no capítulo da investigação. Uma má investigação criminal dita o destino do processo. Vezes há em que a má investigação é deliberada. Há casos em que a PIC omite conscientemente diligências indispensáveis no âmbito da instrução preparatória dum dado processo... E voltando concretamente para o caso albano silva: Consta que não foram arroladas testemunhas( ví no zambeze de hoje). A PIC não lutou em busca da prova. Não conseguiu reunir elementos de indiciação necessários para fundamentar a acusação. O que o Juiz Dimas fez, foi, na verdade, um chamboco ao Ministério Público e ao braço desta, a PIC( Polícia de Investigação Criminal) que só se preocupou em acusar sem contudo efectuar as diligência necessárias. O Juiz deu licções básicas de Direito ao Ministério Público. Fez valer um princípio fundamental do Direito Processual Penal: o famoso princípio " In dubio pro réo" uma expressão latina que significa literalmente a dúvida favorece o réu. Ou melhor, ela expressa o princípio jurídico da presunção da inocência, que diz que em casos de dúvidas (por exemplo, insuficiência de provas) se favorecerá o réu. É um dos pilares do Direito Penal, e está intimamente ligada ao princípio da legalidade. Por tudo isto, portanto, está de parabéns o colectivo de juizes. Está de parabéns o Tribunal Judicial da Cidade de Maputo. Penso que é altura de o Ministério Público acordar do sono profundo em que se encontra actualmente. Nem sei por que razão o Ministério Público não se absteve de acusar. Na verdade, estabelece o artigo 25 do Decreto-Lei 35007, de 13 de Outubro de 1945 o seguinte e cito: "Se se verificar não ter havido crime, ou estar extinta a acção penal, ou se houver elementos de facto que comprovem a irresponsabilidade do arguido, o Ministério Público abster-se-á de acusar, declarando nos autos as razões de facto ou de direito justificativas."E o caso Albano Silva nem sequer estava em condições de chegar à fase do julgamento justamente pelas razões apontadas pelo Juiz Dimas na sentença. Mas chegou!! E já estão a imaginar o prejuízo causado aos réus? Estiveram 8 anos encarcerados. Manifesta irresponsabilidade do Ministério Público. Outro aspecto que merece muita atenção é a celeridade processual. Não consigo perceber como é que um processo iniciado em 1999 só tem desfecho em Julho de 2008. Falta de meios? Não é uma vergonha nacional isto? Reparem que os réus cumpriram mais que a metade da pena que lhes caberia caso fossem declarados culpados pelo homicídio frustrado. Mais uns anitos ( 4 anos), praticamente teriam cumprido a pena e, claro, a sentença de absolvição seria uma pura brincadeira. Que pena!

quarta-feira, julho 02, 2008

"Balcão de atendimento único" sem nada de único

Continuo a postar com irregularidade. Mas sempre que houver oportunidade cá marcarei presença. Hoje venho com um assunto ligado ao funcionamento da nossa Administração Pública. Como forma de tornar a Administração Pública mais próxima do cidadão, criou-se o Balcão de atendimento único. Único porque neste Balcão são "prestados" serviços de toda a Administração Pública, desde a concessão de alvárás, vistorias às instalações, actos notarias, obtenção de Nuit( Número único de identificação tributária) etc, etc. Porém, este gabinete pouco ou nada tem de único. Vejamos então porquê!!
Ao longo do pretérito mês de Junho dirigi-me ao "Balcão de Atendimento Único"( BAU) da Cidade de Maputo a fim de solicitar a emissão de alvará. Um dos documentos que instruia o meu requerimento, continha minha assinatura mas esta não tinha sido reconhecida pelo Notário. Portanto, sem assinatura reconhecida notarialmente os meus documentos não seriam recebidos. Assim, e porque estava eu num BAU solicitei que os serviços notariais alí presentes procedessem ao reconhecimento da minha assinatura, ao que responderam que tal só podia ser feito nos cartórios notariais espalhados pela Cidade... Solicitei que me esclarecessem a razão da presença de serviços notariais no Balcão de Atendimento único. Nenhuma resposta satisfatória me foi dada. Afinal, porquê Balcão de Atendimento único? Porquê "único"? Estará o "Balcão de Atendimento único" em fase experimental? O funcionamento daquele e, quicá, de outros Balcões de Atendimento único está a colidir com os princípios que determinaram a sua criação. Na verdade, foi determinante para a criação dos Balcões de Atendimento Único (BAU), a necessidade de ( i ) aproximar a Administração Pública aos utentes, (ii) melhorar os serviços prestados, (iii) aumentar a qualidade da gestão e funcionamento do aparelho administrativo do Estado. Infelizmente, parece que nada disto será alcançado. Mas então onde é que reside o problema? Residirá na atitude dos funcionários? Ou residirá na ausência de meios humanos e ou materiais? Ou porque há inércia( deliberada) por parte de alguns sectores, em transferir certos serviços para o BAU? O que está a acontecer?